Demasiado
Ora, sempre se ouviu que "tudo o que é de mais, não é bom".
Comida a mais.
Vinho a mais.
Baton a mais.
Lixívia a mais para tirar uma nódoa.
Sol a mais.
Açúcar a mais.
E pensar?
E sentir?
E amar?
Ouvir música? Ler bons livros? (cada um lá sabe o que, para si, é um bom livro) Ver bons quadros e visitar museus ?
Conversas com o meu Pai
Uma vez, o meu Pai contou-me que nos seus tempos de jovem lisboeta, de olhos azuis e charme além fronteiras, teve uma namorada "estrangeira" e, certo dia, a levou a ver a Fonte Luminosa, na Almirante Reis. Quando lá chegaram, ela viu a Fonte cheia de luz e chorou, tal era a emoção. Logo ali terminou o namoro: linda de morrer, mas a sentir tanto, daquela maneira, não era coisa para ele.
Mas, também o meu Pai, dizia que não se cansava de ir a Paris, pois era impossível alguém cansar-se daquela cidade - nunca era de mais ver os edifícios, as pontes, os museus e o Louvre, onde ele ia vezes repetidas, pois lá havia muitas coisas bonitas. Não há ninguém que não goste de ir a Paris - dizia ele. O mesmo para ouvir boa música - havia discos que tocavam várias vezes ao longo de semanas, meses.
Facilitava haver uma balança que pesasse o que sentimos e o que ouvimos, o que vemos. Havia uma medida. E quando chegasse a esse limite, um alarme soava. Quando comemos de mais, as calças de ganga são o melhor alarme.
Pensar de mais, traz o verbo "over thinking". Dizem que não é bom.
Sentir de mais, pode começar por ser a ver a Fonte Luminosa e ir por aí fora.
Amar de mais. Os nossos filhos, os nossos cães e gatos. Os nossos pais e irmãos. Amigos. Não acho que as calças vão apertar por amar de mais. Não acho que me saltem lágrimas pela Fonte Luminosa, mas tenho cada vez mais a certeza que todos gostamos do que é belo e todos gostamos de ser bem tratados, cuidados e amados.
Não há Paris em demasiado, assim como não há amor a mais.
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