a melhor versão de mim
Fui a Marrocos. Fui a Marrocos de Fés a Marraquexe e passei pelo deserto. Dormi uma noite no Sahara e cumpri a "profecia" que me tinha sido ditada um ano antes.
Em Bali, Agosto de 2017, tirei uma carta (uma espécie de Tarot, não sei exactamente), seria a última carta da nossa viagem inesquecível. Foi a carta número 40: a mulher no deserto. Era a imagem de uma mulher de cabelos loiros a caminhar no deserto. E eu não descansei enquanto não fui ao deserto.
Curioso, sendo eu uma pessoa que me lamento das solitudes desta vida, de mãe sozinha, de mulher sem ser amante, de sedução espelhada num vazio, de um vazio de querer estar junto, ter ido parar ao deserto.
Nunca tinha sentido tais ausências na vida: de escala, de proporção, de barulho, de presenças, de pegadas, de coisas, de exteriores. Quando tudo é interior, todos os interiores são desertos.
Pus-me a jeito, percebendo a coragem de que sou feita e abri o peito ao que dali poderia vir.
Fiz o meu "baptismo da solidão" inspirada por um escritor inglês, Paul Bowels, que muito escreveu sobre as suas viagens ao Norte de África, especialmente ao deserto.
E ali estou eu, um pontinho preto no meio das dunas a ver o por do sol, no Sahara.
E tudo nascerá no dia seguinte. E tudo se refaz, a luz incide onde a escuridão permite, e a escuridão dá o espaço à luminosidade. A luz e a escuridão. No deserto apenas há luz e escuridão - o absoluto. Nada mais existe. Nada mais precisamos do que ser luz e escuridão. A vida encarrega-se do resto.
Tão simples, afinal. Mas é preciso atravessar os desertos, os momentos de luz e escuridão, para finalmente chegar à melhor versão de mim.
E é isso que eu quero e confesso: ser o melhor de mim, para mim e para os outros.
Paul Bowels afirma que queremos voltar sempre ao deserto, e eu quero voltar ao melhor de mim.
E tal como África, o deserto tornou-se um vício.
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Adorei esta viagem. Fiquei apaixonada por Marrocos, uma civilização incrível e pelas experiências que vivi. Todas com sentido, todas com propósito.
É assim que faço mais um "carimbo" de África no meu coração.
Aqui fica um excerto do Paul Bowels acerca do Sahara:
...Perhaps the logical question to ask at this point is: Why go? The answer is that when a man has been there and undergone the baptism of solitude he can't help himself. Once he has been under the spell of the vast luminous, silent country, no other place is quite strong enough for him, no other surroundings can provide the supremely satisfying sensation of existing in the midst of something that is absolute. He will go back, whatever the cost in time or money, for the absolute has no price.
Comentários
A luz incide sempre e em todo o lado mas nem sempre a deixamos entrar ou a entendemos como quer ou tem que entrar. A escuridão aproveita o espaço que lhe concedemos.
A luz e a escuridão. O anjo e o diabo que alimentamos pela vida fora. Sem nunca matar-mos um deles. Tão mais fácil se um deles simplesmente morresse. Seriamos apenas um. Bom ou mau, luz ou escuridão, apenas um.
Se a vida se encarrega do resto, quem é, e qual a responsabilidade da vida no meio da guerra do anjo e do diabo (da luz e da escuridão)?
É a vida mais e maior que nós e o que queremos fazer com ela e por nós próprios?