Saudade






Para começar este texto temos de primeiro pôr de lado aquilo que eu não quero que se confunda com a minha "saudade".
Não é saudosismo. Não é a dor da ausência (física e mental). Não é o: "Ó tempo volta para trás!", não é o fado da saudade.
A minha saudade, agora, é das coisas que eu sei que existem, fisica e mentalmente. Que eu sei estão lá, mas que por alguma razão estão longe de mim e é-me difícil chegar a elas.

Por exemplo: as minhas saudades do Douro. O Douro está lá. Eu posso pegar no carro e ao fim de 4 horas estou na Régua. Ele existe e isso traz-me saudades.
Ontem matei as minhas saudades da escrita. Ela é-me acessível. Posso pegar num caderno e escrever. Mas foi ontem entre tanta cumplicidade e amizade que eu matei as minhas saudades.
Tinha saudades daquela escrita. Partilhada e sentida, entre mãos e entre papel.

Agora tenho tido saudades. Muitas. Porque quando nem as palavras nos chegam, nem mesmo escritas, tudo se torna mais longe. E isso deixou-me a pensar. Antigamente é que as saudades existiam no seu pleno direito. Quando não existem telemóveis, nem e-mails, quando não havia telefone e um telegrama demorava dias a chegar. Quando nesse tempo alguém dizia: "tenho saudades tuas". Tinha mesmo! Não era só a ausência da pessoa, o estar longe. Era não haver forma de a conceber na imaginação, porque a voz e a palavra não chegavam.

Existem então as imagens, as fotografias. E então uma pessoa agarrava-se a uma imagem. Então, pensei eu outra vez, e no tempo em que não havia fotografias? Essas pessoas tinham saudades. Mesmo.
Dizem que o mundo é a tal aldeia global e com a comunicação abolimos fronteiras e as distâncias se encurtam. Acabaram foi com a saudade.
O novo mundo suprimiu as saudades. Reduziu-as a um estatuto tão inferior, que as tornou ridículas.
É ridículo hoje sentir saudades de alguém, porque esse alguém está sempre ali (telemóveis, emails, blogs, facebooks, twitters, etc...).

Mas eu sinto-me muito ridícula, porque estou cheia de saudades. Daquelas a sério, à século passado.

Comentários

Anónimo disse…
Infelizes aqueles que nem saudades sentem, pois não será deles a felicidade e o AMOR!
Susana Cabaço disse…
As minhas saudades de escrevermos juntos eram tantas que só tomei verdadeira consciência delas ontem. Continuam a ser o meu chão.

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