Born at the right time

 



Há qualquer coisa de profético em afirmar-se nascer quando temos de nascer. Naquele lugar, daquele Pai e daquela Mãe, naquela família. Porque é uma coisa que não se escolhe, mas é como se todo o mundo conspirasse para que se nascesse naquele dia, naquele lugar, aquela hora. 

Quando vivi em Moçambique essa questão era-me recorrente: conheci sítios tão recônditos, o que podemos dizer que é o 'fim do mundo' e lá estavam pessoas, famílias que nasceram e cresceram ali. Que não escolheram, mas ali estavam.

Comecei a ver a série 'The Sopranos' (mais um escapismo) e há algo de perfeitamente certo entre ver um mafioso a fazer terapia, a ser um homem cheio de vulnerabilidades, e ao mesmo tempo a desferir golpes violentos e letais. Ontem, no último episodio da 1ª temporada, na última cena, está o Tony, a mulher e os dois filhos, rapaz e rapariga, a jantar num restaurante que os abriga numa noite de tempestade. E à volta estão alguns amigos, que calhou estarem no mesmo lugar, também a jantar. Ele propõe um brinde entre os quatro: «À minha família. Em breve, terão as vossas família, e se tiverem sorte, recordarão pequenos instantes, como este, que foram bons».

Faz hoje um ano que mudei de casa e acordei pela primeira vez aqui. Na véspera tinham sido as mudanças. O meu irmão veio ter comigo ao final do dia. Ajudou-me a fazer a cama, num quarto que tinha pouco mais do que isso. Depois saímos juntos e fomos jantar. Voltamos para casa e ele seguiu para Lisboa. Dormi bem, tranquila. Feliz por aquele momento. 

Dez dias depois, o meu Pai entrou para uma residência e depois tudo se foi precipitando em sucessões de dias e de acontecimentos. E em momentos, bons, alguns até muito bons. Nas suas sessões de terapia, o Tony às avessas com a vida, toda 'fucked up', a Mãe num Lar e um grande amigo que morre, pergunta à terapeuta se, 'afinal, a vida é isto?'. 

É isto, parece-me que sim.

Eu acrescento: há alguma coisa que se possa fazer para viver um bocadinho mais acordado? Para nos beliscarmos e perceber que não há segundas vidas, e que são breves instantes? Que tudo é breve e muito rápido?

Porque nascemos no momento certo. E por isso é esta a nossa vida, e não há nada que não se possa fazer se não a agarrar.

('Born at the rigth time', Paul Simon, Live at Central Park, NY, August 15,1991)

Foto tirada pelo meu Pai, em casa, verão 79/80, Rita e João

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