Somos o que lemos, e mais
Não falamos de filhos, maridos, a escola e a empregada, o preço do azeite e a novas massagens reafirmantes. Falamos sobre livros, e falar sobre livros é falar sobre a vida. Sobre a perda, o luto, a tristeza, o amor de Mãe e de Pai, as famílias complexas, as não-famílias, corações partidos, almas gémeas que não são gémeas, casamentos que não são casamentos, sonhos, tantos sonhos, alegria, o passado, o futuro.
Naquela premissa anos 80 de que 'somos o que comemos', diria que somos o que lemos. E aqui inclui-se as redes sociais, os jornais online, as partilhas do whatsapp. Somos o que consumimos. As músicas que ouvimos, as paisagens que vemos, os quadros que penduramos na parede, as paredes que deixamos vazias. Somos as nossas escolhas. A sopa que comemos, o dinheiro que gastamos, as pessoas que amamos, as que deixamos de amar.
Há uns meses, em setembro, entrevistei o Garrett McNamara, que em novembro de 2011, fez o que ninguém tinha feito - surfar uma onda na Nazaré com 23 metros e com isso bater o primeiro Recorde Mundial do Guiness de ondas gigantes. Um homem com uma visão incrível sobre a vida e que disse duas coisas que foram essenciais no seu caminho: a importância das pessoas por quem nos rodeamos, nomeadamente a mulher dele, e as coisas que consumimos, seja comida, musica, leitura, vibrações.
«Acredito que tudo é uma questão de escolha, que melhores
coisas vão aparecer e vamos atingir algo mais. Tudo acontece por uma razão»,
disse-me. E com isso afirma até a dor que tem de ser abraçada e acarinhada. E até a incerteza - essa senhora que ninguém quer ter sentada na sua sala. Na sua profissão, lidar com o risco e a incerteza, faz parte.
A vida é boa, que não se tenha uma dúvida sobre isso. Sentir tudo o que sentimos é sinal que estamos vivos e a sentir a vida a correr por nós. É para a agarrar e senti-la. É para a transcender. Refazê-la todos os dias, nas escolhas que fazemos. Nos livros, nas músicas, nas sopas. Em tudo está uma opção.
A minha meta de uma transcendência, de quase tentar passar à frente da vida, é vivê-la de uma forma cada vez mais simples. Este é o meu desafio para 2024. Seja no Ibo, ou aqui mesmo, em minha casa. Seja a falar e a escrever pelos cotovelos, seja no silêncio - em breve vou estar três dias num retiro (que aventura incrível). Seja na dor, seja no amor. Mas vivê-la inteira e ser inteira com a vida. Não há para mim outra opção, nem concebo que se faça diferente escolha.
Escolher viver a verdade e ser feliz assim.
Sei a verdade e sou feliz
(Alberto Caeiro, Guardador de Rebanhos)
Comentários
Um beijinho, querida Rita.