A montra
Estava um final de dia carregado de sentimentos. Carregado de emoções.
Aguardou que uma chuva miudinha terminasse, que as nuvens dessem lugar a um frio que subitamente parecia elevar-se das pedras, do alcatrão, da terra.
A rua estava triste de gente, mas cheia de vida interior - montes de folhas amarelas amontoavam-se junto às árvores, reflexos de chuva pairavam no ar e toda aquela atmosfera fria encheu-a dessa vida.
Primeiro vestiu-se a rigor, como forma de enfrentar os elementos (galochas, corta-vento, cachecol), depois pegou na trela e no cão e juntos sairam. Os passos dela compassavam a caminhada determinada. Sempre lado a lado.
Depois de uma rua sozinha, veio-lhe esta imagem da melancolia. A montra daquela loja era a imagem do seu sonho, daquilo que a poderia encher sempre de vida. Veio-lhe à memória o som de um piano, de um adagio perfeito e sofrido, do cheiro da resina nas pontas das sapatilhas, do corpo que se molda ao longo dos braços e do pescoço nus.
Pensou para si, nesse mesmo dia, que nunca poderia morrer sem antes escrever uma última linha de palavras.
Mas o sonho, aquilo a que olhava como o mais perfeito de si, seria respirar a dança numa conjugação de música, movimento e sentimento.
Ficou a olhar para aquela montra durante uns segundos e depois voltou à caminhada. Tinha sido um dia carregado de sentimentos.
Comentários
A
Que sorte tens tu, Rita, em guardares dentro de ti tantas coisas magníficas e eternas....
PARABÉNS, nunca desistas de sonhar pois muitos desses sonhos, impulsionados pela tua força interior, vão tornar-se realidade!