Outros Natais

Aqui também foi Natal.

Apesar de toda a falta de “suportes” para nos lembrar dessa data, em que apenas o calendário marca o dia e a véspera de Natal, no Ibo celebrámos o Natal em família. Com a família que tínhamos. Uma família como um grupo de amigos à volta de uma mesa – como um símbolo de família. Não era a minha família no mês passado, mas pela necessidade que todos temos de nos juntar e de nos agregar, juntamo-nos uns aos outros e assim celebramos a noite e o dia da Família.

Estava uma noite especialmente calma e ao contrário do que tinha vindo a acontecer nestas semanas, em que havia sempre uma brisa que refrescava toda a ilha durante o escuro, desta vez, e na noite de Natal, não soprava uma aragem. Não havia vento e com isso o céu misturava-se entre nuvens e estrelas.
Como o nosso bacalhau tinha azedado enquanto estava de molho, resolvemos cozer uns caranguejos que chegaram a nossa casa na tarde de 24, trazidos por um menino que era do mesmo tamanho do saco dos bichos negros e lamacentos. Tinha a roupa tão rota e os olhos tão grandes que a visão daquela criança, na véspera de Natal, trouxe-me a memória de um outro Natal, aquele em que meninos da idade dele escrevem cartas ao Pai Natal, não vão pescar caranguejo durante a maré vazia.

Depois do caranguejo vieram os nossos amigos portugueses de Pemba, que por aqui passaram uns dias em nossa casa, tendo vindo conhecer o Ibo pela primeira vez. Há alguns portugueses em Pemba a trabalhar com ONG’s ou Instituições com Projectos com o Governo de Moçambique, além de espanhóis, franceses, austríacos, etc… A Maria João e o André chegaram com os caranguejos e o exotismo ao lado, pois veio a Yumi, uma coreana (do Sul) amiga do André que trouxe mais um Natal para dentro da Ilha.

Preparamos os nossos 10 quilos de caranguejo, além do arroz doce e do gelado de manga que já tinha ido para dentro do congelador na véspera, e partimos para casa da nossa amiga Lucie, uma Suíça que vive aqui no Ibo, com a mesma vontade do que nós – realizar um projecto de turismo na Ilha.
Em casa da Lucie havia mais amigos e assim pusemos a mesa no jardim, juntamos os nossos pratos e os talheres, vinho, pão, azeitonas e tremoços, uma deliciosa carne com cogumelos silvestres, um bolo de coco e assim estava pronta a nossa Ceia.

Descalços, eu de vestido, ele de calções e camisa, partilhamos aquele momento que pela sua simbologia nos levou a Portugal, nos fez estar à mesa, dentro de casa, com a lareira acesa, o frio lá fora, o bacalhau e as couves, o azeite a regar os pratos, o vinho, os doces e o queijo da serra. Os abraços e as camisolas quentes, a cozinha concorrida de gente, os rituais de já alguns anos desse outro Natal.

No dia seguinte saímos de barco pelas 8h00 para a Ilha do Matemo e ainda fomos mergulhar pelo mar, passamos o dia 25 a passear de barco, com o mar azul turquesa, mais uma vez todos juntos – os mesmos da noite anterior. A outra família. E pelas horas que iam passando eu viajava novamente até Lisboa, e agora para outra casa, cheia de gente e de crianças, para uma sala em que sempre me lembrei de estar no dia de Natal, em que lhe reconheço os cheiros e as cores, com o meu Avô sentado e nós à sua volta. Talvez ele já não se tenha apercebido da minha falta naquele almoço, mas eu acho que se ele soubesse onde eu estava, num barco, a ver peixes, conchas e estrelas-do-mar ele ficaria contente e se pudesse viria comigo também.

Ao final do dia regressamos a casa, cansados e esfomeados! Repetimos a mesma ementa e novamente nos sentamos à mesa. Terminando assim o nosso Natal entre amigos. Nessa noite as estrelas estavam mais brilhantes e estivemos algum tempo de cabeça para cima a olhar o céu – como se fosse esse o melhor presente do mundo!

BOM ANO NOVO!

Comentários

André disse…
...foi o Natal possível, longe das tradições e famílias, mas foi um belo Natal! ;)

beijinhos e abraços...

André (www.tertuliaafricana.blogspot.com)

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