a parede azul
Já aqui disse que acompanho regularmente o meu Príncipe nas suas lides profissionais, diga-se, andar nas obras dos apartamentos que recupera no centro de Lisboa.
Já vos falei por isso das conchas que encontro no meio do cimento.
No outro dia, numa outra obra, deparei-me com esta parede (magnífica).
É uma simples parede, em tempos terá sido completamente azul, agora escavacada e suja, quase vítima de um bombardeamento. A luz era de final de dia, a luz fria do Outono que faz realçar a cor entre o caos de uma casa em obras profundas.
Rapidamente chamou-me a atenção aquele cenário, quase como se fosse um "quadro".
Há riscos de lápis do meio, medidas e um quase número de telefone.
Senti-me aquele tontinho do filme American Beauty que filmava os sacos de plástico ao vento... pois para o que me havia de dar, então.
Mas a verdade é que gosto de ver estas paredes que se revelam por detrás de papel de parede antigo (muitas vezes em várias camadas), de tinta plástica foleira e estuque descascado.
Quando estive em Moçambique visitei sítios rochosos com quedas de água, inselbergs e paredes de rocha maravilhosas. Nesses passeios, tentava sempre parar e colar as minhas mãos à pedra, à parede. Gostava da sensação de sentir a rocha, a força brutal daquelas paredes milenares. Abria bem os dedos, espalmava bem as mãos e uns segundos bastavam.
Aqui em Lisboa, não há montanhas nem quedas de água.
Há paredes azuis que me lembram a alma dos lugares, neste caso, de uma casa. Daqui a poucos dias vai levar com tinta de água em cima, vai-se sumir numa nova cor, mas aquela parede, cheia de feridas, nasceu azul.
E eu gosto de pensar e sentir estas coisas, assim como o outro filmava os sacos de plástico.
É assim e pronto.
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