Não faz mal andar à chuva, quando se deseja a chuva.

O calor nestes últimos dias tem preenchido todos os bocadinhos de ar fresco. Deixa-nos sem forças, incapacitados e permeáveis ao esforço inglório de andar pela rua, de tomar decisões, de entrar e sair dos sítios, de quase existir. Só conseguimos ficar quietos, sentados em frente a uma ventoinha e deixar o vento varrer a temperatura que emerge de dentro da pele.

Quando ontem começou a chover, gotas fartas e contínuas, vinhamos os dois a caminho de casa. Tinhamos passado a manhã na Praia e regressavamos depois do almoço, o único almoço que a barraquinha da Praia serviu. Filetes de peixe com batatas fritas e o peixe cozido com legumes, comida saborosa, sem pretensões, numa casinha de madeira com telhado de colmo em frente ao mar. Em qualquer outra parte do mundo (ocidental) custaria uma fortuna e para se lá chegar levariamos horas, ou estariamos em filas de trânsito, pagariamos um balúrdio e estariamos imenso tempo à espera de vez para almoçar. Ontem, não foi assim. A praia estava vazia, como quase sempre está.
Eramos só os dois e o mar, um calor forte, o sol de quem eu me escondo e os locais que atravessam aquele pedaço de areia sempre com qualquer coisa na mão: peixe, lagostas, colares para vender, amendoins, crédito para telemóveis, cigarros, chocolates (não havia o que eu queria!), pastilhas elásticas... Ninguém ali fica, todos passam.
Regressamos a casa com o sabor do sal no corpo e uma trovoda que se aproximava a passo leve mas determinado. As nuvens pareciam radiografias, escuras e negras, contrastando com o céu azul que ia perdendo a sua luminosidade.
O inevitável aconteceu e metade do nosso caminho foi feito debaixo de chuva. De chuva mesmo. Chuva que entra nos ossos e ensopa as pestanas, sem dó nem piedade. Chuva que cai à mesma temperatura que o nosso corpo, e toda a atmosfera é amena. E nós fazemos parte dela.
Cruzamos com outras pessoas, que sem acelerar o passo, tal como nós, caminhavam à chuva. Uns descalços, outros com sacas de arroz na cabeça, uma cabra comia à chuva, as crianças brincavam na chuva...
E eu por mim, tinha dançado à chuva! É bom quando o nosso corpo atinge a mesma temperatura de todos os elementos que nos rodeiam, é como se fizessemos todos parte do mesmo momento, sem que sejamos parte um dos outros. Mas naquele instante partilhamos a sensação, a chuva, a temperatura.
E já mais frescos chegamos a casa e retomamos a nossa pele!
E ainda ontem à noite ainda caiu mais uma tempestade em Pemba, com trovodada e chuva, chuva, chuva. Havia flashes de luz tão intensa, tão brilhante que iluminavam tudo, seria quase possível de ser ver o fundo do mar, tenho a certeza!
E hoje toda a terra acordou mais fresca e eu desejo ainda mais chuva.
A ver se danço desta vez!

Comentários

Anónimo disse…
Esqueço-me do nome do actor que está na foto.Era um grande bailarino do "show-biz".O filme era o Singing In The Rain.Coisas.Agora tenho de me ir embora.Ao ver esta fotografia sinto-me mais do lado do tempo dos anos 30 / 40 / 50.É que a seguir á segunda grande guerra , depois de terem morrido muitos milhões de pessoas a sociedade como que explodiu em tudo o que tem a ver com a sociedade.Tenho que me ir embora, já volto.
Anónimo disse…
Já sei o que é que queria dizer.È que apesar de eu ter nascido no fim da guerra , fui muito influenciado por todo esse movimento pós guerra , anos 50/60.Tinha a mania que tinha de ir para os US.Esta fotografia tem a ver com isso tudo.
Anónimo disse…
Parece-me que o melhor a fazer durante a vida é tirar partido dela.Para quem saiba fazê-lo.

Mensagens populares