Natureza Mãe

A Natureza só poderia ser Mãe, e a minha vivência em África tem-me dado todos os dias provas disso.

Só uma Mãe pode fazer nascer o sol sobre uma praia, através das nuvens difusas, com rasgos de voos de garças pretas e brancas e ao fundo brincam as baleias em mergulhos de amor profundo;
Só ela pode fazer cair a chuva, como se fosse um homem violento e agressivo, e a faça descer sobre a terra ressequida e sedenta;

Só ela pode fazer com que os pescadores agarrem o peixe quase com as mãos, em tamanhos e cores que reflectem a abundância e a riqueza debaixo do mar;

Só ela pode fazer com que as mulheres carreguem a lenha no topo das ideias, quilos e quilos de árvores esquecidas pelo mar que irão queimar o arroz dessa noite;

Só ela pode desenhar recantos do mundo, junto ao mar, jardins de vegetação verde e abundante, com árvores que vivem entre a areia e a lama, num chão salgado, mas cheio de vida, que depois se transforma num deserto de coral e de rocha, numa paisagem lunar, próxima de um planeta perdido;

Só ela pode preencher o nosso jardim de pássaros de tantas cores, com melodias que mudam conforme a hora do dia, com um macaco que nos visita calmamente e se senta numa pedra, comendo a sua fruta, com o caranguejo que vive no tecto da cozinha, e anda lateralmente entre passeios na relva e subidas ao telhado;

Só ela nos transporta para uma outra dimensão quando decide terminar o dia, com o pôr do sol, em que como uma maestrina, vai invocando todos os elementos, todos os instrumentos: sol, luz, cor, nuvens, céu, pássaros, barcos à vela e mar. E numa composição todos os dias diferente, ela mostra o milagre de sermos parte do Universo, pelas nuvens de cor pastel, rosa e lilás, a luz que aviva o olho encarnado da cegonha, com som das asas de um bando de pelicanos, num sopro perfeito e finalmente com o barco que se alonga no mar denso, com a sua vela e todo o tempo do mundo, como se todo esse tempo fosse aquele barco e aquela vela. E nem mesmo eu, que tire 478 fotografias, chame um pintor ou um realizador, conseguirei algum dia reproduzir o que são este minutos finais do dia, nesta Ilha mágica.

E como se não bastasse, na escuridão morna, salpicada de estrelas e de pirilampos, ela manda vir a Lua, que está cheia como uma bola de luz e faz sombra sob os coqueiros, dando banhos de prata às folhas verdes e gordas das árvores.

Só uma Mãe é capaz de tamanha generosidade, ao mesmo tempo que pode ser cruel e brutal. Só ela é capaz de equilibrar o mundo, como uma casquinha de madeira com uma vela magra e desmaiada que leva o homem e o menino, a atravessar o canal até ao outro lado.

A época das chuvas está a chegar ao seu fim. Toda a paisagem se irá alterar e outras coisas irão aparecer.
Por agora sei que num jardim vivem dois humanos, um macaco, um caranguejo, pássaros que são donos das árvores, e lagartos que dominam o território da relva na sua busca pelo cantinho mais quente do quadrado, neste pedaço de terra que se descolou do continente, no meio do Oceano, num lugar remoto do Planeta.

E mais uma vez dou graças por eu fazer parte disto.

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