Dois pequenos contos para os meus leitores!


Pequeno conto nº 1



Nessa noite sonhei com a morte. Sonhar com a morte significa um renascimento, corte, novo começo.


Acordo abalada com uma sensação estranha, pois. Abro a porta de casa e olho para o chão. Vejo um bicho enrolado, até pensando ser uma barata ou uma aranha, quando percebo que é um pássaro. Está vivo, mas de olhos fechados e com uma respiração irregular. Quando pego naquelas gramas de andorinha, ela não reage às minhas mãos. Trago-a para dentro de casa, tendo antes andando a ver pelo telhado da casa se haveria algum ninho. Parecia-me que ela fez o seu primeiro voo (ainda era uma cria) e caiu no vazio. Um susto horrível!
Pus água na tampa de um frasco de compota e fui-lhe molhando o bico. Reagiu, abrindo e fechando o bico!


Tentou abrir as asas e esticou-se toda. Abriu um olho. Era mesmo pequenina. Sabia que independentemente dos meus esforços, ela acabaria por morrer, pois nunca seria capaz de se alimentar. Ainda pensei que seria bem aceite pela comunidade de pardais que mora no telhado, mesmo por cima do nosso quarto, e que já devem ser umas dezenas dada a quantidade e o escarcéu que fazem todas as manhãs. (para mim é um divertimento ouvir aquela algazarra quando estou deitada na cama; ou estão todos zangados ou todos excitados, ou falta um que foi sair à noite, ou outro que se atrasou com o vento…)


Entretanto, fui mexendo nas asas da andorinha, abrindo e fechando, perscrutei-lhe o peito sarapintado e foi quando vi a sua ferida. Tinha uma saliência grande e avermelhada, pois provavelmente partiu qualquer osso quando caiu lá do alto.


Ela mantinha aquele olho aberto. E eu mantinha-me ao pé dela. As suas costas tinham uma penugem que com a luz do sol ficavam de um azulado brilhante. Começou a ficar muito agitada, irrequieta, mexia-se muito.


Os olhos voltaram a fechar-se. Tentei dar-lhe mais água, mas não era nada disso.
Aquela cor ténue de penas azuladas começou a ficar cinzenta e sem cor, percebi que o seu minúsculo corpo estaria a perder a sua minúscula vida. No seu último gesto, cruzou as asas nas costas, uma trespassando a outra, encolheu as patas mínimas e finalmente abriu os dois olhos tão brilhantes e negros quanto dois olhos minúsculos de andorinha podem ser.


Ficou imóvel – perpétua. Enrolei-a num guardanapo branco e lá fora, na terra encarnada das traseiras da casa, fiz uma covinha, tão pequenina quanto o seu corpo. Há aqui muitos corvos, enormes, pretos com o peito branco, que comem tudo o que se mexe… até quase nos atacam numa cena muito à Hitchcok. Por isso achei melhor escolher um sítio no fundo da terra para ela ficar. Assinalei a sua cova com um pau e duas pedras.

Voltei a casa, fechei a porta. Não sonho há vários dias.
Nota: nesta foto a andorinha ainda estava viva.

Comentários

Anónimo disse…
É uma riqueza essa tua facilidade de criar contos.
E essa riqueza vai aumentando ou diminuindo?
Anónimo disse…
É incrivel mas apesar da andorinha ter morrido, e o que me doí ver bichos a sofrer (sim, eu também sou daquelas que falam com os bichos), fico sempre a sorrir quando leio os teus "bolos"!

Continua assim, porque é uma maravilha este ritual de ligar o computador, ver os mails, ir á procura de um novo "bolo" da Rita e depois sim começar a trabalhar!!!!!!

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