Missão Niassa - Parte II

Sete dias.
2.500 km.
40 horas de condução.
Uma Toyota Hillux 4x4.
Um mapa e dois guia de viagem.
Uma mochila e um saco cama.
Um pneu furado.



Malawi e Lago Niassa.

De Cuamba seguimos até à fronteira com o Malawi, Entre-Lagos. Não era a primeira vez que atravessávamos a fronteira com este País, por isso já sabíamos como iria funcionar. Do que não estavamos à espera era do ar rudimentar de fronteira que esta tinha.
Existem uma dúzia de fronteiras entre Moçambique e o Malawi, e pelos vistos, umas são mais "evoluídas" do que outras.
No caso de Entre-Lagos (saída de Moçambique) e de Nayuchi (entrada no Malawi), parecia que estava a viver um filme de cowboys! O cenário são duas aldeias muito rurais, com uma linha de comboio que as percorre e uma paisagem a perder de vista - parecia que estavamos de volta à Savana no Quénia!
Primeiro, no Posto de fronteira é só locais a carimbar folhas de papel que vão atravessar a fronteira a pé ou de bicicleta, filhos nas costas, trouxas na cabeça, cabras, sacas de carvão - o reboliço do costume. Depois tivemos de (nas duas fronteiras) ir chamar o Senhor da Alfândega a casa, que ainda estava a dormir, para tratar dos papéis do carro (paga-se um imposto de importação temporária). E finalmente, para fazer o seguro do carro (que é obrigatório no Malawi), nem sequer havia uma seguradora por perto, só em cidades maiores e mais longe!
E nós os dois branquinhos, lá no meio, insistindo eles que eu era Sul Africana e o Xano um mustafá argelino!
Where are you from? - Portugal (respondemos os dois ao mesmo tempo).
Whati? - Portugal (voltamos a responder)
Hum... (silêncio entre todos)

Finalmente no Malawi, e na expectativa de visitar o Lago, seguimos junto ao Parque Natural de Liwonde, onde aproveitamos para ficar uma noite.
Com o nosso carro, o nosso fiel amigo, fomos nós próprios para dentro do Parque, e respeitando as estradas e o mapa, fizemos o Safari pelas nossas mãos! Foi divertido e alucinante, pois o encontro imediato com um elefante era muito possível.
Não aconteceu porque a temperatura tinha descido muito nos últimos dias (à noite estava um frio de rachar!) e por isso os elefantes tinham-se deslocado para junto da montanha, onde seria mais quente.
Não foi grande Safari, vimos os do costume (antílopes e macacos e ainda, ao longe, uns hipopótamos) mas valeu a pena por termos conhecido o guarda do Parque. Um local, sopinha de massa, falava inglês com uma pronúncia africana cerrada, todo fardadinho e profundo defensor do "seu" Parque! Tinha no seu guichet uma rã branca, que dormia profundamente enquanto tratavamos das entradas, e que segundo o guarda, andava cheia de frio nestes dias e resolveu entrar num modo de hibernação.
Eu, que adoro sapos e rãs, tirei logo uma foto e ela abriu meio olho!
Acabou por ser um belo passeio pela natureza, com a vantagem de ter sido ao pôr-do-sol.

No dia seguinte estava planeado seguir de Liwonde até Monkey Bay, mais a norte, junto ao Lago Malawi. Depois de horas e horas de viagem em terra batida, finalmente avistamos alcatrão!
A distância seria de cento e poucos quilómetros, mas tínhamos de abastecer e aí começou o problema. Ao que parece, naquela região do País, não havia gasóleo, estava esgotado!
Subimos mais um pouco até ao limite de pode voltar atrás, e na mesma gasóleo esgotado. Resolvemos arriscar e atravessar novamente a fronteira para Moçambique, desta vez em Mandimba; certamente que lá haveria combustível.
Já não iríamos ver o Lago Malawi, mas sim o Niassa e é sempre uma boa sensação de "voltar a casa", quando se entra em Moçambique. E isso soube-nos bem, depois de alguns encontros com polícias do Malawi muito mal formados e brutos e de uma multa pelo seguro que acabamos por não conseguir fazer - e tudo isto em pouco mais de 100 km!

De novo em Moçambique, abastecemos e seguimos até Lichinga! Que maravilha e bela surpresa: tomar uma bica e comer pasteis de nata e tostas mistas na Pastelaria Maria, almoçar uma sopa de feijão e ainda ir à internet ver as últimas novidades do Benfica!
É sentir-se em casa, ou não é?
Pelas 16horas saímos da gelada Lichinga e rumamos até Metangula com o objectivo de visitar o Lago. O tão famoso Lago, que nos diziam que tinha ondas!

Depois de uma estrada estreita a lembrar caminhos por entre a Serra de Sintra, chegamos ao topo de uma montanha e avistamos o Lago lá em baixo com o pôr-do-sol! Foi o primeiro grande momento mágico desta viagem. Ficamos os dois sem fala a ver um autêntico mar que se estendia à nossa frente, a perder de vista. Toda uma massa de água doce, entre dois Países no meio de um Continente.
Ficamos a dormir na Praia de Chwanga, a 8 kms de Metangula, numas cabanas em cima da areia. O vento e as ondas eram fortes, não conseguimos tomar banho, estava frio, mas isso não fez diminuir a nossa admiração por aquele lugar. Provar aquela água doce e sentir um enorme mar à nossa frente foi magnífico!
E mais uma vez, como nos cowboys, aqueceram-me uma panela de água e eu tomei banho de púcaro com água quente que me soube pela vidinha.
Jantamos o peixe do Rio - Chambu - com arroz e não dormimos grande coisa com a barulheira que eram as ondas do Lago. Acordámos pelas 6 da manhã com toda aquela vida de roda da água: mulheres a lavar loiça e a transportar água, crianças a tomar banho, cães - a algazarra do costume!
Agora sim, depois da água e da magia do Lago, partíamos para aquilo que nos tinha trazido aqui. Para o profundo e misterioso Niassa.

(Continua)

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