Ir à Praça...



Assim que chega o calor e a atmosfera mole dos dias abafados lembro-me de ir à praça com a minha Mãe. Devia ser porque era na altura das férias e assim lá ia eu rua abaixo a empurrar o carrinho.

O cheiro dos pêssegos e dos morangos misturava-se com o sol abrasador, havia vespas a levitar sobre a fruta, folhas de alface no chão, abóboras esborrachadas e gomos de tangerinas translúcidas.

Eu tentava sempre procurar uma sombra pois não entendia como era possível alguém aguentar aquele calor (há mais de 20 anos atrás as estações do ano eram fiéis aos equinócios e por isso quando era Verão, era mesmo Verão - um calor insuportável de Junho a Agosto).

Quando finalmente a minha Mãe me levava para a sombra era um tormento... entrava-se então na peixaria! E o peixe todo gordo e luzidio mergulhado em gelo, as lulas moles e o peixe espada preto (que me fazia imenso medo).

Havia as flores e o pão e ainda a senhora dos ovos que os devia estar a cozer debaixo de um pano onde ela os escondia. Redondinhos e perfeitos.

Fui muitas vezes à praça com a minha Mãe. Muitas vezes me magoei nas rodas do carrinho e levava caneladas nas pernas (pela falta de jeito, pois), escondia-me nas sombras e fugia das vespas que se entretinham na polpa da fruta que pingava o chão preto de pedra e alcatrão.

Dias de calor, de cheiros antigos...

Foto: Mercado dos Lavradores, Funchal.

Comentários

Anónimo disse…
Fiquei com um nó na garganta que já sei só se vai desatar lá para a noite.Não é por nada é só porque eu tambem tenho ido com ela á praça.Agora por acaso ela vai sózinha com o trangalhadanças rua abaixo e depois eu vou busca-la porque o trangalhadanças cheio já pesa.Quanto á senhora que por magia produzia duzias de ovos que apareciam debaixo de uns cartões e cestos tambem a conheci era um fantástico numero.Mais uma descrição ou um report lindo de morrer cheio de generosidade.
Anónimo disse…
Parece que andas a expiolhar o teu passado...faz bem ao teu ego e também a mim pois vejo que tens bons recuerdos!
Realmente levava-te para todo o lado pois não tinha a quem deixar-te e devo dizer que agora, passados que foram 32 anos, aprecio verdadeiramente a tua companhia no passado..talvez por estar na idade de voltar a fazer tudo sózinha.
Rita disse…
quando ia para os lados da drogaria é que às vezes me deixava nos baloiços do Jardim do Visconde da Luz, e dizia-me: não fales com estranhos e não aceites rebuçados e pastilhas! uma inconsciência nos dias de hoje)

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