Mãe


O jardim que antecede a entrada da casa, unindo o portão à porta de madeira branca de quatro janelas em vidro e duas portadas compridas, é um quadrado verde perfeito.
Ao meio tem um caminho de pedra cinzenta, dos dois lados a relva, e a contornar o muro, os canteiros. Naquele tempo, havia ainda uma ameixoeira e um limoeiro. O limoeiro ainda hoje existe, o alpercheiro substituiu a ameixoeira.

De Verão enchia-se de verdes, de flores cheias de cor, de abelhas e besouros, de lagartixas e de formigas empreendedoras, e de bolas de futebol que os meninos da rua, sem querer, deixavam lá cair.
No Inverno vestia-se de gotas de água e sacudia o vento dentro de si.

Era raro o dia em que a minha Mãe não estivesse no Jardim, a maioria das vezes a cuidar dele, que a sabia de sua volta. A podar roseiras, a sulfatar o limoeiro que estava permanentemente com bicho e outras maleitas - mas que mesmo assim dava limões – a aparar as trepadeiras, a espreitar para dentro da terra a ver quando vinham de lá as flores. Quando o tempo a deixava, fazia do jardim o seu escritório, dava aulas a alunas estrangeiras, lia, dormia a sesta e até levava o cavalete e as tintas para as suas pinturas.

No Inverno, conversava com ele lá de dentro, espreitando pela janela. Seguia o estado da relva, fazia o ponto de situação das flores – normalmente a roseira nunca estava no seu momento certo – discutia com o meu Pai se devia plantar um arbusto de ibisco ou mais patas de cavalo.
E namorava-o assim durante todo o ano. A minha Mãe recebia-me da Escola no Jardim, foi no Jardim que eu cresci e que nós os quatro nos juntávamos todos os verões ao jantar.

O Jardim era o mundo da minha Mãe - e eu a ela sempre a imaginei como uma borboleta branca, a gozar cada flor, a pousar em cada canto, a cheirar os limões e a levitar docemente pelo cheiro da terra molhada.

Serpa - Retiro de Escrita, Julho 2008

P.s - Parabéns, querida Mãe!

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