Last but not least...




















































O fim da viagem estava a chegar.


Depois de uma noite em Nelspruit, saímos para a visita ao Blyde River Canyon, mesmo às portas do Krugger, o terceiro maior Canyon do Mundo (antes estão os EUA e a Namíbia) mas o primeiro mais verdinho.Os outros são secos como ossos, este sempre é mais colorido. Deve ser todo ele bonito e verde, mas acontece que nesse dia em que decidimos visitá-lo e registar as espectaculares paisagens, estava a chover, havia carragas de nevoeiro e para melhorar havia uma greve! Os guardas dos portões de acesso aos miradouros e locais de vista fecharam as cancelas e pronto, os turistas que se lixem.


Coloquem no Google (Imagens): “Blyde River Canyon”. É lindo de morrer não é? Conseguimos chegar perto de um dos miradouros e já foi uma sorte. Antes disso, ainda visitamos uma aldeia histórica, Pilgrim’s Rest, do tempo das minas e da corrida ao ouro (que se iniciou no século 18). Lá ainda se respira o espírito da época, séculos depois, havendo até umas lojas que tiram fotografias com os fatos, os décors e as cenas da época! Mas estava tanto frio, que a ideia de ter de mudar de roupa fez-me rapidamente desistir do programa, que deve ser bem divertido.


Passámos a noite em Swadini, no local da Barragem do Blyde River; dizem que é lindíssimo também, mas os acessos estavam fechados, greve é greve, senhores! Dormi que nem uma pedra, entre o silêncio das montanhas (devia então ter escrito: “dormi que nem uma rocha”), acordando para um dia de sol e calor esplendoroso! Parecia que o dia anterior tinha sido uma mentira e rumamos ao Krugger para ver bicharada até mais não.
Contámos quantos safaris já tínhamos feito e com o Krugger estávamos a fechar os 10 safaris em saídas mas seis, se contarmos os diferentes Parques. Ou seja, já não gastamos 19 fotografias com um impala e dois javalis e criámos um código entre nós, para quando nos deparamos com esta bicharada da "base" da pirâmide: são as batatas! Zebras, impalas e toda a gama de bambies, gnus, javalis e porcos selvagens = batatas. As girafas já merecem alguma atenção e os hipopótamos são sempre cómicos de se ver. De resto o “gatilho” da máquina já só dispara pelos Big Five: Elefante, Rinoceronte, Búfalo, Leão e Leopardo; e pelos pássaros, sempre.


Mesmo assim, depois do Krugger, comecei a considerar o Elefante uma semi-batata. Vimos muitos, pois vimos. Em 5 horas, nós, e o nosso KIA Rio, vimos tudinho, faltando só mesmo o Leopardo. Até vimos três leoas e um leão, que tinham acabado de comer umas “batatas” e por isso estavam sujos de sangue da matança! Foi espectacular! Uma espécie de “trânsito na estrada” permanente e até divertido.


O Leopardo. No Centro de Reabilitação de Moholoholo, mesmo junto ao Krugger, tivemos um encontro imediato com esse bicho maravilhoso, solitário e astuto (que até já tínhamos conseguido ver no Niassa, no meio do mato e na escuridão). O Centro, uma autêntica lição de vida, de natureza e de comunhão com os bichos. Estivemos com águias e abutres, chitas e leões, e até com um rinoceronte de 18 meses - uma pequena bestinha que dá marradinhas nas pernas! É um local que recolhe e trata os animais, a maioria são presos em armadilhas e redes (vedações) e as aves ferem-se nos postes de electricidade.


A Lição que aprendi, é de que a natureza já não se consegue equilbrar sozinha. Sem a ajuda e a intervenção do Homem, caminhamos para um destino triste e para a perda de cada vez mais espécies na terra. Por exemplo, há uma águia, a águia africana que faz os ninhos nos buracos das árvores mais altas, normalmente embondeiros e assim. E há muitos poucas hoje em dia, menos ainda porque os elefantes, que são aos milhares naquela zona do Krugger, destroem as árvores para comer os ramos e as folhas e com isso dão cabo dos ninhos das águias que assim não se reproduzem.


O que aprendi é que apesar de serem animais selvagens, a convivência com o Homem, por um longo período de tempo, fá-los julgar que são pessoas, que são humanos. Mesmo as aves. Eu estive ao lado de uma chita que parecia um gato de casa, o leopardo juntou-se a mim, do outro lado da vedação e passei a mão pelo pêlo dele: tão suave. Eles esquecem-se de que são selvagens e assumem-se como humanos. E por isso, há 10 anos construíram o Centro, porque muitos bichos não podiam ser devolvidos à natureza, pois morreriam certamente. E qual o nosso papel? Eles diziam de uma forma muito natural, que os animais não falam, não têm voz e por isso nós, humanos, temos de falar por eles. De outra forma eles não têm hipótese de sobreviver num mundo dominado pelo Homem. Vai demorar tempo, mais vai acontecer...


Não é a primeira, nem será a última vez que eu escrevo neste Blog sobre a sempre intensa e milagrosa relação que me fascina entre os homens, os animais e a natureza. E no injusto e constante jogo entre as duas forças que partem de tão diferentes patamares: a natureza é sempre generosa, o homem é sempre tão egoísta.

E não é por uns serem vegetarianos que se ajuda mais a natureza; as plantações de cereais e vegetais, estufas e regadios implicam milhares de campos, de terra e terra a perder de vista, onde milhares de animais deixam de ter local de pastagem e de nidificação (é nessas vedações que os bichos ficam apanhados).

Outra coisa aprendi, que muito estupidamente os homens resolveram criar imagens de animais “fofinhos” e não fofinhos, como por exemplo as hienas que são feias. Fiquei fã das hienas, são dóceis e porque apenas têm aquele aspecto marreco e aquele riso velhaco ninguém gosta delas. São super inteligentes, sem elas a selva seria um caos, elas limpam tudo (comem ossos), funcionam como famílias autênticas e juntas conseguem caçar um leão. Mas como a Disney as fez feias e más, ninguém gosta das hienas e todos adoramos os leões.

Enfim, é a nossa urgência em “humanizar” tudo à nossa volta que nos faz tomar estes princípios, afinal tão sem sentido.



Mas é como somos, e no final de contas estamos todos no mesmo saco: vegetarianos ou não. E o que importa perceber é que isto não caminha para melhor. É importante conhecer estes projectos, acreditar, doar, sentir a causa.

Depois do inesquecível Chewy (o leopardo, com um nome sugestionável!) e do Krugger, em que a certa altura só nos faltavam as pipocas, tal era a diversão, regressamos a Nelspruit para na manhã seguinte apanhar o autocarro que nos levaria até Maputo.


Era o fim da nossa viagem. Entregamos o KIA Rio com um aperto no coração e contamos 4.000km de estrada feita. Suspirámos por roupa lavada, fizemos as últimas sanduíches de pão de forma e fatias de queijo fundido “A Vaca Que Ri” e fomos para a paragem esperar o autocarro. Pagámos 13 euros cada um pelo bilhete. O autocarro levava 62 passageiros, três eram brancos o resto era tudo moçambicanos que já vinham desde Joanesburgo. Oh! Saudades da minha terra! Tudo a discutir pelas sacas de cebolas e pelos frangos a descongelar na bagageira do autocarro, crianças aos berros, pacotes de 1 kg de Corn Flakes e caixas de 32 ovos, embalagens de pão de forma e de flocos de aveia, garrafões de óleo de cozinha e rolos de papel de cozinha, só faltava mesmo o pêssego em lata para eu me lembrar quando há uns 25 anos íamos a Badajoz comprar água de colónia e caramelos pinhoñes, que em Lisboa era tudo uma miséria.

Afinal, vale a pena encher uma camioneta de mercearias.


A passagem da fronteira foi feita a pé, de um lado (RSA) carimbámos o passaporte de saída, do outro (na Fronteira de Ressano Garcia) entravamos em Moçambique. Muda logo tudo. Há lixo no chão, música aos gritos, gente a correr por todos os lados, polícias corruptos e mal encarados. Mas, Oh! Saudades da minha terra! Antes de parar no Centro de Maputo, na Av. 24 de Julho, ainda estivemos na Matola sem perder o pitéu da malta a descarregar o “City to City”, com 40 toneladas de víveres e outros tantos quilos de gente.



Para o fim, sobraram uns poucos, entre eles os 3 brancos. Descemos, inalamos bem o cheirinho da cidade e apanhamos um tuc-tuc até à casa da nossa amiga Mafalda, onde já nos sentimos tão bem. E antes de subir ao magnífico 21º andar, ainda bebemos uma cerveja (eu uma Cola Zero) e comemos uns cajus, uns tremoços e uns amendoins na esplanada do Piri-Piri.


Que maravilha; tinha sido uma viagem fantástica mas sabia mesmo bem ter chegado a “casa”!

Comentários

Anónimo disse…
Já estive em Angola no tempo da guerra colonial.Como tal estive lá dois anos sempre no interior.Sei o quanto todo aquele ambiente marca na memória das pessoas.Tudo o que escreveste ficou no teu consciente (não sei se é consciente ou sub-consciente) onde estão os cheiros e os sons.É marcante pela beleza e grandeza.Eu não voltei lá.Gostava de estar lá em tempo de paz.Mas tenho quase a certeza que tu vais lá voltar várias vezes.

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