Apertos do Coração

Hoje saimos de casa às 6 da manhã para ir deixar o Xano ao barco.
Tinhamos decidido que ele iria de barco com toda a carga até ao Ibo e eu seguiria de carro pelo caminho do costume - o encontro seria no Ibo. Eu primeiro, ele depois.
Disseram que a viagem iria demorar um dia, 12 horas.
O Xano iria no barco com o Gonçalo, o nosso amigo português da mota, que a deixava ficar em terra.
Carregamos o carro com tudo ontem à noite e hoje levantei-me para preparar um mata bicho bem forte para o meu "marinheiro". Combinamos no sítio onde fomos buscar a arca congeladora,
na Praia do Murrébue, perto do Pirata. O carro seguiu até à praia e o barco lá estava no mar.

Confesso que estava de coração apertado, e mesmo antes de chegar ao sítio sentia um nó na garganta. Seria a primeira vez que nos iriamos separar ao fim de já muitos meses juntos, seria a primeira vez que iria fazer uma estrada de 120km em terra batida sozinha, no meio de África, e com um carro gigante em que mudar uma roda deve ser uma batalha dura, seria a primeira vez que ele iria fazer uma viagem de barco durante tantas horas pelo mar, de dia e de noite, longe da terra e com nenhum meio de comunicação comigo.

A viagem de barco parecia-me relativamente pacífica, mas não conseguia deixar de me sentir ansiosa por ele ir pelo mar fora até uma Ilha no meio do Pacífico. E por isso tudo dormi mal, acordei muito antes da hora e tive sonhos esquisitos.

Quando lá chegamos a tripulação dava tudo menos um ar credível, eram todos moçambicanos e começaram logo por pedir mais dinheiro, o dobro do que julgamos estar acordado. Aceitamos. Depois disseram que chegavam lá daqui a dois dias, e depois que talvez demorasse um.
Rapidamente todos sentimos um mau feeling naquela conversa, naquele ambiente em que eu queria tudo menos que o Xano embarcasse naquele barco.

Desistimos do plano, mas partimos hoje os três, daqui a pouco de carro, sendo que amanhã o Xano regressa a Pemba para vir buscar a arca congeladora. Mesmo assim irá fazer uma viagem sem mim, estaremos separados por algumas horas - o que continua a apertar-me o peito que fica sempre pequenino - mas tudo é melhor perante aquela viagem cinzenta.

Foi a primeira vez que senti todas estas coisas, pois nunca imaginamos o que tranquiliza quando temos ao pé de nós quem mais amamos e quando sabemos que à distância de um telefone chamamos um amigo ou um familiar para nos ajudar. E aqui não se passa bem assim...
É tudo uma questão de garantir a nossa protecção e de algum tacto. Fazer opções certas, saber interpretar os sinais tal como se fossemos zebras no meio da savana sempre em alerta aos predadores.

Estou mais tranquila, mas sei que amanhã, quando ele voltar sozinho a Pemba de carro vou ficar novamente com o coração pequenino...
Até lá.

Nota: como vamos para o Ibo as ligaçãos á internet são muito limitadas.

Comentários

Anónimo disse…
Pois é. Eu tambem tenho o coração apertadinho por causa disso tudo.Noites , africanos , chuvas , estradas, pneus furados etc.Parece estarem as cartas todas na mesa.Nunca falei destes meus receios porque dizem que sou pessimista.Não sei que castigo é que nós todos estamos a pagar.Não sei a quem pedir auxilio.Vamos todos esperar.Tenham cuidado.

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