Cristovão
É o primeiro dia de aulas. Está calor. Só foi de manhã. Depois do almoço a Mãe foi buscá-lo à Escola e juntos voltaram para casa, nos Anjos.
A mochila está meio vazia, a Mãe não comprou os livros. A Professora disse que não era preciso, que havia de se arranjar uma solução. Cristovão não percebe por que não tem os livros, não pergunta. Ele não se importa. Dá a mão à Mãe e segue-a pelo Metro, ela nunca se perde ali dentro. Às vezes confunde a mão da Mãe, perde-se por uns segundos, e então olha para os pés. É fácil. São os que são pretos, com as pernas pretas.
Durante as férias, Cristovão brincou na Rua. Fez uma bola com jornais "A Dica da Semana" e fita cola bem forte, que a Senhora do café lhe deu. Brincou com os meninos, seus vizinhos e até foi convidado para a festa de anos do Zé Luís do prédio branco e janelas verdes, no 3º andar. Havia balões, gomas e chapéus do homem aranha. Ele nunca tinha ido a uma festa de anos com balões e gomas, muito menos com chapéus do homem aranha.
Quando chegou à Escola, parecia também uma festa, como a do Zé Luís, mas eram muitos mais meninos e não havia os balões, as gomas e os chapéus do homem aranha. A Mãe falou-lhe da Escola, os vizinhos falaram-lhe da Escola, até o Zé Luís falou-lhe da Escola. Se todos falam é porque devia ser qualquer coisa importante. Se até foi com a Mãe comprar uns sapatos e uma mochila, então é uma coisa mesmo muito importante.
E até aquele dia, Cristovão foi pensando na Escola, que toda a gente falava e ficou um bocado assustado. Quase que teve medo. Foi como naquele dia em que correu atrás da bola e como se esqueceu de apertar os atacadores, caiu e esfolou o joelho todo e viu sangue a escorrer-lhe como uma fonte. Assustou-se e teve medo. Mas não chorou.
No primeiro dia de aulas Cristovão também não chorou, mas teve um bocadinho de medo. Já na sala de aula, sentou-se ao lado de outro menino, que tinha um estojo do homem aranha. Afinal era como se fosse a festa do Zé Luís!
Voltou contente para casa, agarrado à mão da Mãe.
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