Das coisinhas da vida # 3
Do mudar de vida.
Nunca, num período tão curto, se falou tanto em "mudar de vida". É o leitmotiv do ano que quase termina. Temos de mudar de vida.
Ora eu, 34 anos de gente em permanente crescimento (mental diga-se, que do outro fiquei-me aos 13 anos) e mudança, fui a personificação desse lema quando decidi, com o meu marido, ir viver para um outro Continente, num outro País, ter uma outra "profissão", viver numa outra casa, numa outra cidade, com novos vizinhos e amigos e estar muito, muito longe de uma vida "normal".
Quando voltamos, um ano depois, percebi que afinal não é preciso ir para uma Ilha no meio do Índico (ver textos com a etiqueta "1 ano em Moçambique"), sem luz nem água canalizada para conseguir mudar de vida. As ilhas desertas e os locais paradisíacos estão dentro de cada um de nós. Mesmo.
Para os encontrar, aí sim, há que mudar de atitude, o que não obrigada a mudar de vida tão literalmente e drasticamente como eu e o meu Príncipe fizemos. Até porque bastaria termos filhos para que nada disso se concretizasse. Eu duvido que me fosse mudar para um local onde a malária existe e mata, estando a milhares de kilometros de um Hospital com padrões ocidentais/europeus.
Assim sendo, a tal mudança da atitude passa por momentos/ passos que, com o bom marketing da numerologia, eu identifiquei como sendo 7:
1º Fazer perguntas. Não as da "idade dos porquê", mas aquelas em que nos questionamos acerca do que nos rodeia. A primeira é a mais óbvia: quero MESMO mudar? Sim.
Então, o que nos faz sentir bem? o que nos incomoda? o que nos faz mudar de ideias? o que nos faz pensar? o que?
Este primeiro passo é o pior e o mais difícil. Porque fazer perguntas, obriga a ter respostas e muita gente não quer ouvir o que o "universo" tem para lhe contar. É duro e é preciso querer-se questionar. Passamos a julgar que estamos esquizofrénicos quando ouvimos uma vozinha interior que talvez pela primeira vez na vida fale. Mas ela existe e sempre existiu. Ela responde e não cobra nada por isso.
2º Pensar. Com a vozinha esquizofrénica que há em cada um, começar a pensar com ela. Vamos no metro, no autocarro, sentados ou em pé, e a vozinha vai falando, vai vendo, vai questionando. Pensamos no que nos faz querer mudar. Pensamos qual a dimensão de nós que quermos mudar: não temos de passar a usar cabelo encarnado, vestir roupa com algodão orgânico e comer abóbora biológica para achar que mudamos. É de dentro que tem de vir a mudança.
3º Encontrar uma paixão. Algo que realmente gostamos de fazer, uma coisa que nos faz sentir mesmo, mesmo bem e em que usemos a nossa energia, em que nos empenhemos para que ela surga. Coser meias, assar lombos de perú, correr maratonas, fotografar árvores, escrever postais, pintar gesso, coleccionar livros antigos; o que quiserem desde que usem o vosso corpo e a vossa mente para o fazer.
4º Partilhar. Com os amigos mais chegados, com a família, com o marido ou a mulher, namorado ou companheiro, alguém que nos conheça bem. Essa pessoa sabe quem somos, sabe o que somos além de sermos bancários, cabeleireiros, gestores ou funcionários do clube desportivo da Amora. Das melhores descobertas da minha vida tem sido o quanto os meus amigos me conhecem bem, o quanto eles gostam de mim e sabem quem eu sou. Eles ajudam a dar-me um "chão", um ponto de referência, para que eu possa gerir todas as implicações que a mudança traz e as suas consequências.
5º Ser sincero. Consigo mesmo e com os outros. Ter a mesma atitude por dentro e por fora. Assim, mantemos a cabeça livre, evitamos dogmas, preconceitos, verdades absolutas, ideias pré-concebidas. Mantemos um circuito livre e aberto dentro e fora de nós.
6º Arriscar. O nível de risco pode variar, mas ele irá existir sempre quando tomamos uma atitude de mudança. Engane-se quem julga que é possível mudar sem qualquer risco. Mesmo quando mudamos de casa arriscamos. A que nos calhe um vizinho demoníaco, por exemplo. Tem de se aceitar que se vai arriscar. E isso torna tudo muito mais interessante, verdade?
7º Não ter medo. Vem um pouco no seguimento do arriscar. Mas o medo é uma coisa muito mais lixada. É uma coisa boa, quando usado na medida certa, pois as descargas de adrenalina são o que nos mantem vivos, desde o tempo dos nómadas, em que andavamos a caçar nas estepes, mas pode paralisar-nos. Sentir medo é sinal que estamos vivos, mas também pode ser um obstáculo à mudança. O medo tem de existir q.b.
A receita é simples e parece fácil. Eu aprendi-a porque fiz uma outra coisa, que é essencial à mudança: errei! O erro é o que nos permite avançar. E que não se julgue que vai acertar logo à primeira. Isto leva tempo, não é uma aspirina efervescente. Têm de haver tentativas atrás de tentativas.
Diga-nos que para este Bolo sair perfeito, o tempo é o forno e o erro é o fermento. Já a forma é sem dúvida a vontade de querer mudar.
Bons cozinhados e bom fim de semana!
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